Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

Sessão da Meia Noite

Comentários pessoais e (in)transmissíveis sobre cinema e televisão.

Sessão da Meia Noite

Comentários pessoais e (in)transmissíveis sobre cinema e televisão.

The Hateful Eight - Os Oito Odiados

O Sessão da Meia Noite apresenta aqui o seu comentário ao mais recente trabalho de Quentin Tarantino.

 

poster.jpg

The Hateful Eight – Os Oitos Odiados, 2015, de Quentin Tarantino, com Samuel L. Jackson, Kurt Russell, Jennifer Jason Leigh, Walton Goggins, Demián Bichir, Tim Roth, Michael Madsen, Bruce Dern, Channing Tatum.

 

Para o seu oitavo filme, Quentin Tarantino, escreveu um western, passado na América profunda no pós-guerra civil, mais propriamente nas montanhas do Wyoming, no meio de um inverno muito rigoroso.

 

hateful-eight-soundtrack-score-listen-morricone-ta

 

O elemento motor da história é um caçador de fugitivos John “The Hangman” Ruth (Kurt Russell) e a sua prisioneira Daisy Domergue (Jennifer Jason Leigh) que este irá entregar ao Xerife de Red Rock para ser enforcada.

 

Pelo caminho, encontram um colega de profissão de John, Major Marquis Warren (Samuel L. Jackson) que, atendendo ao agravar da tempestade, lhes pede boleia. Após algumas peripécias e alguns bons momentos de humor negro, lá seguem todos.

 

maxresdefault 2.jpg

 

Contudo, o agravamento da tempestade não permite chegar à cidade, pelo que se dirigem a um entreposto no meio das montanhas – Minnie's Haberdashery, para pernoitarem e esperar que a tempestade passe.

 

Ao chegarem ao entreposto, encontram quatro estranhos que, aparentemente, também aguardam o passar da tempestade para seguirem caminho. Contudo, esta circunstância provoca desconfiança aos recém-chegados, até porque a prisioneira de “The Hangman” tem uma recompensa muito elevada.

 

the-hateful-eight-set-design-002.jpg

 

Temos assim a trama montada, numa teia de interesses escondidos, em que cada um trás a sua bagagem passada, que vai provocando atritos no interior da casa.

 

Neste ambiente fechado (dois terços do filme passa-se no interior do entreposto) observamos o desenvolvimento das histórias de cada um, que têm sempre algo contra o próximo, numa espiral que vai envolver muita violência, racismo, desprezo pelas mulheres, pelos negros, e pelos mexicanos.

 

As tensões entre cada um dos hóspedes do entreposto vão se agudizando com o passar do tempo e a convivência forçada. Os estranhos vão começando a demonstrar comportamentos que refletem a possibilidade da existência de um objetivo comum aos quatro.

 

h83.jpg

 

Quentin Tarantino, que escreve e realiza, faz aqui uma homenagem aos homens duros e violentos do oeste, num ambiente rigoroso e hostil, onde a desconfiança mútua é regra, numa obra que, não sendo superior a Pulp Fiction (1994), não lhe fica longe.

 

Abrilhantado com grandes performances de Kurt Russell, Samuel L. Jackson e Jennifer Jason Leigh e pela música original de Ennio Morricone (que lhe valeu mais um Óscar) este filme não desilude. No entanto, e apesar do Óscar, o início do filme promete um score musical mais presente e grandioso do que aquele que vemos ao longo do filme.

 

Apesar da qualidade indiscutível do filme, dentro dos parâmetros a que Quentin Tarantino nos habituou, no final, fiquei com a impressão de que poderia ser melhor, uma vez que toda a publicidade à volta deste lançamento criou uma expectativa tal que não foi totalmente cumprida.

 

 

A Rapariga Dinamarquesa

Após uma pequena paragem de férias da Páscoa, o Sessão da Meia Noite continua a ver e comentar os galardoados com Óscares deste ano.

danish-girl-2015-poster.jpg

The Danish Girl – A Rapariga Dinamarquesa, 2015, de Tom Hooper, com Eddie Redmayne, Alicia Vikander, Amber Heard.

 

A Rapariga Dinamarquesa é um filme de época, biográfico, cuja ação desenvolve-se no plano de um romance dramático, sobre a vida do pintor holandês Einar Wegener – Eddie Redmayne, e a sua mulher Gerda Wegener – Alicia Vikander.

 

sem nome.png

 

A ação decorre em 1926, em Copenhaga, numa altura em que Einar, um pintor afamado de paisagens, tenta ajudar Gerda a convencer os galeristas do seu valor, além do seu trabalho habitual de retratista.

 

einar wegener painting.jpg

Além da influência sobre os galeristas, Einar também começa a posar para Gerda, para completar um quadro de uma mulher que esta estava em curso. A partir daqui, Einar começa a descobrir em si comportamentos e sentimentos pouco consentâneos com a sua masculinidade.

 

Einar descobre em si a personagem de Lili Elbe, que começa a exteriorizar além da privacidade da sua casa, usando roupas de mulher, maquilhagem e uma peruca.

 

Com o tempo, Einar sente que Lili começa a ser uma parte integrante da sua personalidade, mais confortável para si do que a sua condição masculina.

 

Estas alterações começam a causar alterações na relação entre o casal, até um ponto de rotura, em que ambos percebem que Einar, já não é Einar mas sim Lili.

 

Lili e gerda.jpg

 

Esta relação transforma-se num triângulo amoroso com um amigo de infância de Einar – Hans Axgil (interpretado por Matthias Schoenaerts), a quem Einar/Lili recorre para apoio moral e ajuda a perceber a nova realidade de Einar/Lili.

 

Envolvida num crescente sofrimento com o seu corpo, Einar/Lili inicia um processo de mudança física do seu corpo, com uma série e operações de modo a mudar fisicamente de sexo, algo totalmente experimental para a altura.

livro.jpg

Esta dramatização da vida de Einar/Lili realizada por Tom Hooper, baseada no livro “A Rapariga Dinamarquesa” de David Ebershoff, faz uso de uma excelente fotografia que nos transporta para a Dinamarca do início do século XX, com uma cor que faz com que as imagens pareçam verdadeiras pinturas.

 

Ambos os atores principais têm aqui grandes interpretações, sendo o Óscar de Alicia Vikander para melhor atriz secundária completamente justificado. Não fosse Leonardo Dicaprio, Eddie Redmayne também poderia ter vencido facilmente o Óscar para melhor ator principal.

 

O tema da transexualidade é abordado com o devido respeito e sem qualquer paternalismo, mostrando a perspetiva do sofrimento interior de uma pessoa que, desconhecendo o que se estava a passar, trava uma luta interior imensa para conseguir sentir-se confortável consigo mesma.

 

Esta é uma história de luta, que nos mostra que a batalha mais importante é aquela que travamos diariamente para nos sentirmos confortáveis com a pele que envergamos todos os dias.

 

 

4DX chega a Portugal

Mais uma novidade na experiência de ver cinema vai chegar a Portugal. Irá ser inaugurada no próximo dia 24 de março, no GaiaShopping a primeira sala com a tecnologia 4DX.

 4DX_Logo.jpg

 

Esta será a primeira sala de cinema do país a ter cinema multidimensional em que se proporciona ao espetador uma experiencia imersiva, numa “revolução da forma de ver cinema”, de acordo com o comunicado oficial da NOS Cinemas.

 

Esta novidade em Portugal, resulta de uma parceira entre a NOS Cinemas e a Sonae Sierra e dando continuidade a uma parceria que teve início em 2013 com a instalação do IMAX no Centro Comercial Colombo.

 

01.jpg

 

A tecnologia 4DX é um passo à frente do IMAX, em que as salas de cinema são alteradas de modo a proporcionarem diversas sensações aos visitantes como voar, cair, acelerar ou travar, recriando efeitos ambientais presentes na tela, de modo a aproximar ainda mais o espetador da ação da tela.

 

Para uma sala poder disponibilizar esta tecnologia ela terá que sofrer diversas alterações, nomeadamente a instalação de equipamentos que suportem a tecnologia 4DX, seja equipamentos de projeção, som, e cadeiras. Esta tecnologia permite recriar efeitos como movimentos da cadeira, vibração, cócegas, sprays de água, vento, relâmpagos, nevoeiro, cheiros e aromas, chuva, bolhas, tempestades e neve.

 

4dx-Effects.png

 

Para que um filme possa ser visto com esta tecnologia, uma faixa adicional, a chamada faixa 4DX, é programada juntamente com as faixas de vídeo e áudio, de modo a comandar todos os ”efeitos especiais” em sincronia com a imagem e o som.

 

A sala 4DX tem 100 lugares e vai abrir com o filme “”Batman v Super-Homem - O Despertar da Justiça”, com bilhetes a 12,00€.

 

batmanvsuperman-xlarge.jpg

 

Estas coisas ajudam-nos a perceber a nossa real dimensão no mercado mundial do cinema, pois esta tecnologia foi introduzida comercialmente em 2009 na Coreia do Sul, e, em 2015, encontrava-se instalada em 239 salas em 39 países.

 

Chega agora a Portugal. Antes tarde que nunca!

Uma Vida a Teu Lado

Fugindo um pouco da temática dos filmes premiados com Óscares, o Sessão da Meia Noite vai hoje apreciar um romance dramático, na minha opinião é mais um teen romance do que um drama.

The-Longest-Ride poster.jpg

The Longest Ride – Uma Vida a Seu Lado, 2015, de George Tillman Jr., com Scott Eastwood, Britt Robertson, Alan Alda.

 

Este filme, cuja tradução para o Brasil me parece mais genuína e adequada (Uma Longa Jornada) tem argumento de Craig Bolotin, e foi baseado no best-seller homónimo de Nicholas Sparks.

longest-ride.jpg

A ação acompanha a história de vida de dois casais de gerações diferentes. A primazia é obviamente para o casal mais novo constituído por Sophia Danko (Britt Robertson) e Luke Collins (Scott Eastwood) que, a dada altura salvam de um acidente na estrada Ira Levinson (Alan Alda).

Alan-Alda-and-Britt-Robertson-photo-by-Michael-Tac

Ira vai servir de incentivador da história entre os dois, essencialmente no papel de contador de histórias, acerca da sua vida em comum com a sua mulher, já falecida, Ruth (Oona Chaplin).

 

Como é natural neste tipo de histórias, Sophia pertence a um meio completamente diferente de Luke. Ela é uma estudante de arte com perspetivas de trabalhar numa importante galeria de arte de New York, e ele um antigo campeão montador de touros em rodeo.

 

17407748.jpg

 Como os opostos se atraem, os dois apaixonam-se e vão tendo vários encontros e desencontros impostos pela inerência das suas diferenças e catalisados pelas histórias e conselhos de Ira.

 

Este filme é um exemplo competente de um romance, polvilhado por um pouco de drama, para não ser demasiado cor-de-rosa. A trama foi bem construída pelo realizador, que aproveitou as capacidades dos atores, especialmente Britt Robertson que tem muita experiência de teen movies e tenta agora dar o salto para os filmes dos crescidos.

 

longest-ride 3.jpg

 Aqui desempenha o papel de uma estudante de arte, finalista, que pretende dar o salto para a grande cidade, quando se apaixona por um rapaz da terra que a faz repensar as suas opções.

 

Vamos também descobrindo aos poucos as capacidades de Scott Eastwood que começa a trilhar o seu caminho sem receios de comparação com o pai – Clint Eastwood. A expectativa é alta. Este ano tem presença confirmada em três filmes – Overdrive, Esquadrão Suicida e Snowden, onde esperamos vê-lo em papéis mais exigentes.

 

A completar o ramalhete temos Alan Alda, um distinto Senhor do cinema americano, com um currículo irrepreensível, que oferece um suporte de legitimidade e substância aos jovens atores nesta história, completando eficientemente a narrativa.

 

O argumento acaba por ser uma interpretação leve do romance de Nicholas Sparks, contudo demasiado cor-de-rosa e um pouco artificial.

 

No entanto, e apesar dos defeitos, é um filme que gostei de ver, exatamente pela sua leveza descomplexada, porque nem sempre necessitamos de desafios psicológicos com variantes filosóficas. Também precisamos de histórias com finais felizes para equilibrar a balança.

 

 

Trumbo

Hoje, o Sessão da Meia Noite vai analisar mais um título nomeado para os Óscares, sem que este tenha vencido qualquer galardão.

trumboposter.jpg

Trumbo, 2015, de Jay Roach, com Bryan Cranston, Diane Lane, Hellen Miren.

 

Este filme, com argumento de John McNamara, baseado no romance “Donald Trumbo” de Bruce Cook, relata um pouco da história Americana dos anos 50 do século XX, numa altura pós Segunda Guerra Mundial, em que o mundo entrava na Guerra Fria, um período de desconfiança para com a então União Soviética e o comunismo em geral.

 

813GogNgUrL__SL1500_.jpg

Nos Estados Unidos dos anos 40 e 50, o medo do comunismo, que atingia níveis de paranoia galopante, promoveu muitos saneamentos por suspeita de ligações ao partido comunista, causando centenas de despedimentos a simpatizantes comunistas e, até mesmo a alegados simpatizantes.

 

Num país em que a liberdade é uma bandeira essencial, e que a liberdade de expressão está consagrada na Primeira Emenda da Bill of Rights – a Constituição Americana, em vigor desde 1791, o medo da “conquista interna” por parte do papão comunista fez com que fossem sendo tomadas medidas contrárias à referida emenda, opressivas e até de repressão, que limitavam as liberdades dos cidadãos.

 

Um dos destinatários destas medidas foi Hollywood, sendo um alvo fácil, pela grande publicidade envolvida no negócio filmográfico, e pela facilidade de criar exemplos de admoestação para que outros sectores da sociedade americana tivessem receio de seguir pelos mesmos caminhos.

BryanCranstonHelenMirrenTrumbo.jpg

Foi o tempo da chamada Caça às Bruxas em Hollywood, e dos comités patrocinados pelo Senador Joseph McCarthy – House Un-American Activities Comittee, que perseguiam os simpatizantes comunistas indiscriminadamente.

 

É este o contexto retratado no filme, personificado pelo exemplo do argumentista famoso Donald Trumbo, e as dificuldades que este teve que suportar por ser simpatizante comunista numa época em que tal era considerado como antiamericano.

 

Trumbo-2.jpg

 

Bryan Cranston – o conhecido Walter White de Breaking Bad (criativamente traduzido por Ruptura Total), tem um desempenho irrepreensível como Donald Trumbo, construindo o personagem muito semelhante ao Trumbo original (de acordo com as referências da critica especializada), com muitas das suas particularidades de trabalho (as cenas de escrita na banheira são as minhas favoritas).

 

Trumbo vai funcionando sempre com o objetivo de trabalhar para suportar a sua família, mas sem se vergar perante a opressividade das comissões senatoriais, e das pressões da imprensa, personificadas pela colunista Hedda Hopper (Helen Mirren sempre irrepreensível), apoiada por atores famosos como John Wayne (aqui retratado por David James Elliot).

  

Este filme acaba por ter dois significados muito explícitos. Em primeiro lugar é acima de tudo de uma referência histórica, muito bem construída, de um período da história americana que importa conhecer para se perceber até que ponto o medo do desconhecido pode levar uma sociedade, que se diz justa e livre, à repressão dos seus cidadãos.

 

Em segundo lugar, para o público americano, trata-se de uma oportunidade de expiar pecados antigos, fazendo um mea culpa por comportamentos discriminatórios, muitas vezes iguais ou piores daqueles que se diziam querer combater.

 

Este filme é na sua essência um drama biográfico de uma referência de Hollywood, muito bem construído, essencial para quem gosta de temas históricos.

 

 

Room

Continuando a viagem pelos filmes galardoados com Óscares neste ano, o Sessão da Meia Noite viu recentemente o Room – Quarto.

room_movie_poster v.jpg

Room – Quarto, 2015, de Lenny Abrahamson, com Brie Larson, Jacob Tremblay, Sean Bridges, Joan Allen, William H. Macy.

 

Este filme foi uma das surpresas do ano na época dos prémios americanos de cinema “Awards Season”, pois sendo uma produção completamente independente conseguiu acumular nomeações e prémios fora da normalidade para outsiders em Hollywood.

 

O argumento de Emma Donoghue é uma adaptação de um romance escrito também por ela, onde acompanhamos a história de Jack – Jacob Trembly e sua mãe Ma/Joy Newsome – Brie Larson, que se encontram cativos numa sala – “room”, sem puderem sair.

room.jpg

 

Percebemos mais tarde que Joy foi raptada quando tinha 17 anos por um homem – Old Nick, que a fechou no seu barracão de jardim e a passou a tratar como escrava sexual. Desses encontros, alguns anos mais tarde, nasce Jack, que é forçado a partilhar o mesmo espaço sem puder sair.

 

Jack nunca esteve fora do quarto, pelo que o trata como a totalidade do seu universo, personificando alguns móveis. Este seu universo claustrofóbico só é um pouco ampliado por uma televisão, a preto e branco, que existe no quarto.

 

Com o desenrolar da história algumas questões vão surgindo:

  • Porque Joy não tinha fugido?
  • Como tinha aguentado tanto tempo naquele espaço exíguo?
  • Porque parece tão conformada?

 

Ao longo do filme vamos percebendo que a razão inicial foi o medo que esta tinha de Old Nick, mas que mais tarde foi substituído pelo instinto protetor para com Jack.

 

Joy criou um mundo para Jack fazendo com que, apesar da televisão, ele não sentisse falta do mundo exterior e de tudo o que as crianças da sua idade costumam fazer, pois também nunca as tinha experienciado antes.

 

room2.jpg

 

Contudo, o quinto aniversário de Jack põe em movimento uma série de eventos que irão culminar na fuga de mãe e filho do seu cativeiro e a sua exposição ao mundo exterior.

 

O trabalho do realizador Lenny Abrahamson, juntamente com as performances extraordinárias de Brie Larson e do estreante Jacob Tremblay, transportam-nos para o interior daquele quarto claustrofóbico, tentando perceber os quês e porquês daquela situação, e torcendo para que a fuga seja bem-sucedida.

 

Com a fuga levanta-se outro problema que é a readaptação ao mundo exterior por parte de Joy e o seu ressentimento por ter estado tanto tempo presa, e a completa descoberta de um mundo completamente novo por parte de Jack.

 

 

No fundo, a história não é um policial onde temos um crime para ser desvendado, mas sim um conto sobre a ligação estreita entre mãe e filho, em condições psicológicas extremas que se molda ao espaço do quarto e que, uma vez no exterior, têm muitas dificuldades em se reajustar.

 

brie-larson-435.jpg

Este filme é psicologicamente exigente, uma vez que trata de assuntos e situações muito injustas e penosas, envolvendo uma criança de cinco anos, mas que vale muito a pena pela qualidade das interpretações que nos levam para aquele quarto e nos colocam quase no lugar dos protagonistas.

 

Vemos aqui que o Óscar atribuído a Brie Larson é completamente justificado (Melhor Atriz Principal), sem qualquer desprimor para Cate Blanchett, cuja interpretação em Carol também está num nível muito elevado.

 

 

Carol

Continuando a senda dos nomeados aos Óscares, o Sessão da Meia Noite comenta o filme Carol de Todd Haynes.

carol poster 2.jpg

Carol, 2015, de Todd Haynes, com Cate Blanchett, Rooney Mara, Sarah Paulson, Kyle Chandler.

 

Num ano em que a cerimónia dos Óscares foi dominada pela alegada descriminação da Academia para com os profissionais negros, esta acabou por ser dominada por filmes que retratam outro tipo de minorias, concretamente de natureza sexual.

 

Este filme retrata a relação proibida entre uma dona de casa de meia-idade – Carol Aird, numa brilhante interpretação de Cate Blanchett, com uma empregada em balcão de um grande armazém, aspirante a fotografa – Therese Belivet (Rooney Mara), nos anos 50 do século XX.

carol e therese.jpg

 

Numa altura em que o lesbianismo não era aceite pela sociedade americana, demasiado conservadora, vemos o desenvolvimento da atração entre Carol e Therese, num movimento de toques dissimulados a estranhos, de olhares escondidos, de sentimentos expressos sem palavras.

 

O realizador Todd Haynes fez um trabalho muito bom na construção da realidade dos anos 50 e do modo possível de relacionamento entre as duas mulheres. Carol, sendo casada, ainda que em processo de separação, e com uma filha pequena, percebe que tem muito a perder se não aceder às chantagens do marido para retrair os seus sentimentos por Therese.

 

Kyle chandler.png

O marido – Harge Aird, protagonizado muito eficientemente por Kyle Chandler, tenta de tudo para que Carol volte para ele e, quando percebe que isso é impossível recorre ao uso de detetives e à chantagem para retirar a Carol todos os direitos sobre a custódia da filha de ambos.

 

Carol ainda tenta ceder às pressões mas depressa percebe que o que sente por Therese é mais do que uma paixão passageira e que não poderá continuar a negar os seus sentimentos e a sua natureza, sob pena de se tornar completamente infeliz.

 

Este filme, ainda que possa parecer um pouco longo, tem uma narrativa muito bem desenhada que necessita de tempo para crescer e se desenvolver.

 

carol pic.png

 Cate Blanchett, no papel de Carol, em uma interpretação excelente, superior ao que vimos no Blue Jasmine de 2013, sempre algo teatral, numa referência dissimulada mas suficientemente clara à sua vida de falsas realidades para que possa ser socialmente aceite.

 

therese.jpg

Rooney Mara começa a ser especialista em fazer personagens difíceis e desadaptadas socialmente. Em Therese, esta faceta é revelada de um modo muito natural, justificando perfeitamente as suas duas nomeações para Óscares, sendo uma delas pelo filme Carol.

 

prince of salt.jpg

 A história escrita por Phyllis Nagy, foi adaptada de um romance de Patricia Highsmith chamada “The Prince of Salt”, mostra com um elevado grau de realismo as dificuldades de relacionamento e adaptação social entre duas mulheres.

 

Este reflexo no filme resulta do respeito e do conhecimento causal sobre o assunto: lesbianismo nos anos 50, ao que não é alheio o facto de Patricia Highsmith ser lésbica e do realizador Todd Haynes ser homossexual.

 

O filme não tem qualquer libertinismo inconsequente, e é na realidade uma história de amor proibido, socialmente inaceitável, mas belo como qualquer outra história de amor.

 

 

Brooklyn

No rescaldo da cerimónia dos Óscares, o Sessão da Meia Noite vai passar em revista alguns dos títulos nomeados para os melhores do ano, começando por Brooklyn.

brooklyn poster.jpg

Brooklyn, 2015, de John Crowley, com Saoirse Ronan, Emory Cohen, Julie Walters, Domhnall Gleeson.

 

Este filme retrata um pouco da história do povo Irlandês em New York, nos anos 50, nomeadamente as vagas de emigração para a América, fugindo à um futuro sem perspetivas, para a terra das oportunidades.

 

lead_960.jpg

Toda esta epopeia é personificada em Eillis Lacey – Saoirse Ronan, uma jovem mulher que viaja da Irlanda para New York, por conselho e insistência da sua irmã Rose – Fiona Glascot, que fica na Irlanda com a mãe de ambas Rose Lacey, deixando um trabalho irregular numa mercearia de bairro sem grandes expectativas.

 

Em New York instala-se numa pensão em Brooklyn para mulheres emigrantes, protegida pela igreja irlandesa de Brooklyn, na figura do padre Flood, interpretado por Jim Broadbent, que também lhe consegue arranjar trabalho como vendedora num armazém de vendas.

 

brooklyn-movie.jpg

A sua vida vai evoluindo normalmente no trabalho, afetivamente, e também no campo amoroso, apesar das saudades da família e da Irlanda. Aqui, o realizador coloca um grande peso dramático no sofrimento de Eillis em estar longe de casa e da família.

 

Contudo, a normalidade de Brooklyn é perturbada pela notícia do falecimento da irmã.

 

Esta situação particular faz com que Eillis volte a casa, encontrando uma Irlanda diferente, onde as oportunidades parecem não faltar, de trabalho e amorosas. Contudo, existem algumas coisas que nunca mudam...

 

O argumento pega na história da imigração irlandesa no bairro de Brooklyn, e tomando como foco central a personagem de Eillis que é o fio condutor de todo o filme. A sua prestação é boa mas daí a ser nomeada para melhor atriz principal nos Óscares, achei um pouco demais.

 

Esta constatação advém da sua pouca expressividade que faz com que as suas reações sejam demasiado subtis e até algo monótonas. Sendo Eillis o principal elemento do filme, o tom monocórdico é algo constante, refletindo-se nas ligações com as sub-histórias do argumento.

 

É um filme onde não faltam atores ou atrizes nomeados ou oscarizados, como a própria Saoirse Ronan com duas nomeações, Jim Broadbent com um Óscar e dois Globos de Ouro e Julie Walters com duas nomeações para Óscar e um Globo de Ouro. Também Domhnall Gleeson consegue deixar a sua marca através das pequenas aparições que tem no filme, e a sempre interessante Emily Bett Rickards num pequeno papel, ligeiramente histérica, fora do universo de Arrow.

 

Talvez tenha sido esta reunião de qualidade que convenceu os membros da Academy of Motion Picture Arts and Sciences a presentear este filme com três nomeações para Óscares.

 

Em minha opinião só o argumento merecia a nomeação, devido essencialmente à segunda parte da história.

banner-brooklyn-Brooklyn_Film_844x476.jpg